Esta semana andei con moi pouco tempo dispoñíbel para procurar poetas novas brasileiras a divulgar. Efecto diso é que escolla a Francesca Cricelli, a súa poesía, xa me era coñecida desde cando participou, en 2017, nun obradoiro de poesía na illa de San Simón. Encontro poético dirixido por Yolanda Castaño (moito ten feito pola poesía galega a Yolanda, e que pouco se lle recoñece, a meu ver) e no que participaron, ademais de Francesca, Rita Dhal, Estevo Creus, Antón García, Hu Xudong e Tomica Bajsic. Dores Tembrás creo que tamén andou por alí. Sabedor dese evento, esa foi a primeira vez que me acheguei á poesía de Francesca. Ben, ese é un dos motivos. Outro é a súa innegábel calidade poética. E, aínda se queren, o feito de que escribira sobre Galiza (ela emprega Galicia, poderán ler dous poemas despois), que sempre é algo que chega moi fondo.
Na verdade, Francesca Cricelli é unha poeta que xa ten un nome, internacionalmente falando. O poemario Repátria publicouno no Brasil e en Italia (2015,2017), 16 poemas +1 publicouno nos USA (edición da autora, 2017) e en Reykiavik (2017, ambos). No 2019 deu ao prelo a plaquette As curvas negras da terra , en edición bilingue (portugués e castelán). E en Errância reuniu as súas crónicas de viaxe, tamén de 2019.
Así mesmo é tradutora, e como tal traduciu á italiana Elena Ferrante, a tamén italiana Igiabá Scego ou a gañadora do Pulitzer Jhumpa Lahiri (nortemaericana de orixe bengalí).
Dito sexa isto para dar unha idea da súa actividade, nunca pretendemos exhaustividade.
Compre sinalar tamén que se ocupou da correspondencia amorosa entre Giusseppe Ungaretti e Bruna Bianco. E é de todas as poetas que levo divulgado, a que máis conexión ten coa Galiza, ademais de a Yolanda Castaño sei que coñece a Antía Otero, Maribel Longueira, Marta Rodrígues Marcuño, Manel Monteagudo ou Amauta Castro.
Este artigo divulgativo quere ser plataforma desde a cal ese número reducido de coñecid@s se amplíe, debería sernos unha utora moito máis familiar ao público poético galego.
Hei dicir tamén, que o título deste artigo suxeriumo a mesma Francesca nesta entrevista, na cal “acepta os seus límites” e é esta, a meu ver, unha maneira de trascendelos mediante a beleza do que escribe, porque aí si que non ten límites. Velaquí unha postura radicalmente diferente a outra que precisamente pretende trascender límites eliminándoos para deste xeito chegar a un totum revolutum que ten menos de literariamente novidoso do que eles/elas pensan.
Fica por dicir que é unha viaxeira incansábel, esta que medrou entre Brasil, Italia e Malasia. Naceu en Ribeiraão Preto, 1982, e ademais de poeta e investigadora é tamén tradutora, como xa se viu. Por riba, compartimos unha paixón ( que eu non podo practicar como quixera, as costas protestan!), cociñar.
Son moitas as influencias/referencias que se atopan na súa poesía. Non imos gastar tanto tempo/espazo nesa tarefa, ficará para outro día. A min, en concreto atráeme a facilidade coa que Francesca me remove sentimentos, partindo tanto de xeografías-imaxes do cotián, da vida diaria, como é capaz de achegarse desde aí ao pensamento trascendente. Francesca escribe como descubrindo mundos que están ao noso redor ou mesmo dentro de nós.
Agora, fican vostedes coa súa poesía:
É UMA LONGA ESTRADA REPATRIAR A ALMA
Há que se fazer o silêncio
para ouvir os dedos
sobre o velho piano da ferrovia
é uma longa estrada repatriar a alma
a rota é na medula
descida íngreme
ou subida sem estanque –
demolir para construir
e não fugir do terror sem nome
de não ser contido
apanhado, compreendido
é preciso seguir adiante
no fogo e sem ar
e se a dor perdurar
é preciso ser destemido
para espelhar o rosto
em outros olhos
distantes como num espelho.
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AZUL
Há algo triste no azul dos teus olhos,
algo perdido e infinito neste azul dos teus olhos,
algo de azul
no triste dos teus olhos.
Há algo de teus olhos neste triste azul, algo perdido
no infinito do azul dos teus olhos,
algo infinito no azul perdido dos teus olhos.
Há algo azul
no infinito triste
dos teus olhos
perdidos.
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CAMINHA INVISÍVEL
Caminha invisível o amor
na multidão doída e apressada
entre olhares dispersos.
O amor caminha só,
anjo atravessado por passos rápidos.
É menos do que um mendigo o amor
na hora do rush, na plataforma dos trens
e a cidade incandesce
minutos antes do pôr do sol.
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REMOVER DO CORPO AS CROSTAS DO SILÊNCIO
No se puede contemplar sin pasión.
Borges
Remover do corpo as crostas do silêncio
tudo que é vivo e exposto grita
e gira, pela avenida
a dor se junta ao rumor.
Para chegar à clarividência
procura-se um ritmo, qualquer um,
que descompasse as artérias –
a vida enverga sobre a avenida
no peito só a voragem do eterno,
a fração do abalo sísmico,
desenha na mão cataclismos.
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A ESQUINA
Como los dardos en el aire
ávidos de su herida
Borges
A vida é uma esquina,
no cruzamento bate uma bola
sobre a corda bamba uma menina.
A rodovia opaca respinga no rosa dos ipês.
Há novembros em que só
jacarandás nos salvam,
deve ser por isso
que o coração do céu
tem nome de furacão.
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QUANDO A PRIMAVERA ATRASA
Quando a primavera atrasa
e pode não mais chegar
à cidade, o céu se acinzenta sobre ela –
levanto os olhos e perco a amplitude.
O infinito está nas ruas,
há cores nos guarda-chuvas,
nas lanternas, nos semáforos.
Há que se iluminar a cromatura das vias
para refazer a primavera.
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CATEDRAIS
Força sutil e estrondosa
a nossa, catedral
erguida no peito vazio –
no silêncio dos olhos,
sós e incessantes
construímos um penhasco,
ponte de uma dor a outra.
Como todo ser vivo,
hoje estamos
cada um com seu vício
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RISCO
O tempo se arrisca
no mistério
da prece.
O resto é mar.
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À MINHA CAIXA TORÁCICA
What will endure here the longest must be thoughtfully provided for [Zbigniew Herbert, To my bones] | Agora ficou fácil Salvamo-nos da carne [Vasko Popa, Osso a Osso] |
Expande no meu sono quando respiro
sob a pele selada pela noite
e oculta os cortes invisíveis da carne
o que nesta cavidade permanece desenraiza o quarto
duas caixas torácicas em paralelo, algo incompleto
se o peito é pródigo
mas cala a fala e seca lágrimas
o que perdura é esta moldura
gaiola de ar e batimento
esta ossada não estará
no Museu Nacional, não,
estes ossos nossos não serão encontrados por arqueólogos
não foram feitos para vitrines
porque quando vivos abrigaram o pássaro
à esquerda de cada um no desencontro do abraço frontal
um canto da serra do mar, um canto de outro lugar
debaixo da terra ou sob o sol dos nossos nada sabemos
só existem aqui no agora e no silêncio os ossos
esta caixa que tudo cinge no escuro
tudo que hoje arde e descompassa
já contém os vermes da terra
contém o pedaço da vértebra de nascença
passado e futuro
nem entalar a garganta dos cães
nem ser o hiato dos séculos
enquanto há seiva e sangue
estar eretos
roçar as costelas celestes
já que nada mais sei.
§
MURMÚRIO DO BRANCO
[sobre um desenho da cidade de Krumau de Egon Schiele]
Chove sobre as cores,
é um auto-retrato
o amaranhado do ocre e do laranja
uma lança que perfura o olho divino a falta.
Colore a densidade populacional nos mapas, o ocre,
mas as casas andam vazias
e no interior das coisas cantamos nus como Sophia.
Está no murmúrio do branco
o caminho do carvão
e eu o persigo pelas linhas, com os dedos
firmes sobre as janelas e as tuas costelas
as casas andam desabitadas de ti
da desordem vital
que confere têmpera à luz oblíqua da tarde.
Não há sismo
e os jardins são todos internos
os desertos todos interiores e anteriores,
eles resistem ao regar das horas
resistem
ao esmiuçar com os dedos os pastéis a óleo sobre a folha de papel.
Arden las pérdidas
como na praia as labaredas vulcânicas sob a lua cheia de Reykjavík
e aporta
aporta
aporta também o esquecimento
esta casa velha.
§
PRELÚDIO
Entro nos teus olhos como num bosque/ cheio de sol
[Nazim Hikmet]
É na ausência do pássaro
que se compõe o canto,
ou na recusa da fruta
de vir à rama quando não estás?
A orquídea do quarto
represa em suas raízes
toda a água para varar a noite;
eu caminho deslocando ponteiros.
Não há hora que falte
nem tempo de sobra;
o silêncio é a tua medida
e mantém-me o passo.
O resto é voo.
§
ENSEADA
Afora/ o teu olhar/ nenhuma lâmina me atrai com seu brilho
[Vladimir Maiakovski, Lílitchka!]
Trovoa ao longe
e um lampejo filtra o pano violáceo do céu
iluminando o quarto.
É um prenúncio,
sussurro de gotas sobre as costelas de Adão.
Na pele e na rua
deslizam os carros
deslizam teus dedos
deslizam sanguíneos
nas úmidas superfícies e cavidades —
n’algum lugar em mim e na cidade
chove torrencialmente;
mas para além
do recosto oblíquo dos olhos
para além da rotação dos planetas
no ponto em que não se vê e está
há a música
regência cósmica das esferas
ali por trás da curva do globo.
Ir ao fim do mundo
para apanhar a concha da vida,
e colocá-la aqui
no arco infinito dos teus lábios.
Na enseada da Costa da Morte
a vida quebra mais viva
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Caminha invisível o amor
na multidão doída e apressada
entre olhares dispersos.
O amor caminha só,
anjo atravessado por passos rápidos.
É menos do que um mendigo o amor
na hora do rush, na plataforma dos trens
e a cidade incandesce
minutos antes do pôr do sol.
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Nature boy
I never have the courage to speak of you
vast sky of my neighborhood
Never of you, Zbigniew Herbert
Não tenho sob as pálpebras da memória
uma casa mítica para a qual retornar.
Tenho perdido o cheiro dos contornos
os nomes dos objetos, as cores do jardim.
É um corpo de atritos o retorno.
Só me detenho sobre as sombras das pernas
sobre o rosto do sagui emudecido,
olhamo-nos
por trás da parede de vidro em movimento.
Converso com os mudos e os insensatos.
Suporto dilúvios entre os túmulos.
Você me diz
é difícil ser historiador da própria história
e diz que um aceno de futuro é mais forte
que a antologia de motivos para não vivê-lo.
O poeta também me diz
não se surpreenda por não poder descrever o mundo
e só abordá-lo com ternura pelo nome.
Mas chove e não posso falar
do vasto céu desse bairro.
Leio Zbigniew Herbert para não dormir
so many feelings fit between two heartbeats
so many objects can be held in our two hands
Mas você fala dos recortes do passado,
das fotografias, das matrioscas.
Desacelera.
Tudo se fez bairro nesta cama
desde que minha alma salva
esbarrou no seu futuro
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Cabra-cega dos corações miseráveis
Para Ana C.
Em outubro, pela primeira vez, acordo imersa em meu próprio mar.
Ainda que turva e em desalinho, há a vista.
De tanta vida liquefeita, crescem inteiriços, ao redor dos olhos, óculos, algum anteparo.
O corpo nu.
A cabeça escafandro.
Os peixes, fabulosas iscas do futuro, escondem-se entre as anêmonas,
nos cantos, entre as paredes.
E há escombros, relíquias, destroços.
Coral vermelho no centro do quarto.
A morte nos absorve inteiramente.
Choramos com a facilidade da nascente.
E consumida pela água, pelo tempo, sou vestígio de uma nave.
Um timão atravessava-me o ventre.
Mas quanto tempo
tarda a morte
a morrer?
Lençol freático
Epppure resta
che qualcosa è accaduto, forse un niente
che è tutto
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Eugenio Montale
nada mais do que
uma
linha imaginária
divide da reserva a superfície
o silêncio caudaloso
alimenta as cisternas
tudo que o céu devolve
corpo recolhido
entre as margens
O que resta incrustado
no côncavo da memória?
luz refletida sobre o Arno?
som de córrego?
lua cheia colorindo as artérias da Amazônia
ou o Tietê putrefato?
Só
o hipnótico
incessante movimento
diz:
‘nem tudo termina por aqui’
há tanto curso
até o mar,
nossa existência aquática
há sempre um rio
para medir a sede
do mundo
levo sob os pés
o lençol freático da ausência
[do 16 poemas +1, 2017]
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Botão
Minha mãe insistia que pregasse o botão solto à camisa de linho.
Que removesse o fio que já não o prendia,
que refizesse o alinhavado entre as fissuras.
Que o mesmo se segurasse bem sobre o tecido,
para não ter de pregá-lo quando enfim caísse,
poderia perdê-lo pelas ruas, sem notar.
Mãe que ensina ver o frágil antes da quebradura.
Antes das coisas se perderem pelas ruas.
Antes do peito se expor à intempérie do tempo e do olhar.
Muito mais do que costura,
mãe, olhar atento às coisas por um fio.
Tê-las nos dedos com cuidado e paciência.
Refazer o caminho do fio entre os furos.
[do 16 ljóð + 1, 2017]
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Ser o sal que tira do mundo a cegueira do branco
As torres desta cidade elevam-se como declarações de amor
diz Zagajewski num poema póstumo para Herbert
admiro a altivez régia dos teus poemas
e eu adentro os tácitos fios desta conversa entre poetas
peço licença pela lembrança
na Avenida Paulista não eram as torres
mas as antenas sobre elas
e as confusas elevações
que se refletiam nos olhos da Gualtieri
que comigo caminhava e dizia
o que são estes braços metálicos que apontam para o céu?
seriam estas as catedrais de São Paulo?
onde não há horizonte faz-se no céu uma saída
e que saída se faz quando tudo é céu e tudo é mar
onde só há horizonte
como represar a paisagem por trás dos olhos?
retroceder no espaço como as geleiras
rasurar fiordes sobre a pele
nos esgarçamos aos poucos quando não nos perdemos
deveríamos autorizar o tempo, o longínquo, as quedas d’água
o sonho que ronda o nosso sono
paira sobre os olhos
sobre as pálpebras fechadas
há tanto vento em ti e tanta estrada à frente
as nuvens não estarão sobre nós para sempre
no equilíbrio entre a melancolia e o riso
traçar o risco
enraizar as declarações de amor
plantá-las como tempero
fazer com que cresçam feito tomilho numa estufa geotérmica
ser o sal que tira do mundo a cegueira do branco
[São Paulo, 14 de março de 2018]
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As curvas negras da terra
Nesta madrugada arderam
como a muralha chinesa incendiada de lume
as montanhas da Galícia;
o dorso do dragão em chamas
esteve à espera de um São Jorge aquático que nunca chegou.
Era uma serpente de lava a subir e descer
as curvas negras da terra entre Allariz e Redondela.
Daqui, da ilha de São Simão, ainda
envolvida na bruma tóxica,
sonho a fecundidade do nosso futuro.
A novidade da morte percorre-te
a espinha, brasa gélida
converte-se em pranto mudo o medo
às margens do porto azul dos teus olhos.
Desfaz-se a memória, água adentro.
Tememos a falta do que habitaria o porvir
e então traduzes o que quase sei numa língua desconhecida.
Chove e não posso caminhar à beira-mar
para colher-te o olhar daquela margarida,
cristo branco, erguida sobre as pedras centenárias,
flor dilatada ao vento com olhar de súplica ao céu:
igual os meus pulsos quando, em meu sono, os sorves.
[São Simão, Galícia, outubro de 2017]
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Do you know god?
protege toda uma cidade o Esja
como ninguém
como mais nada
protege
dizes
anteparo para o mais cortante dos ventos
mas há algo de contorno ou travessia no dia
salta além da parede rochosa
vem do mar
vem e corta o rosto
vem e traz o sal aos lábios
um degelo demorado pode nunca se avistar ao horizonte
o céu leitoso acachapado cresce como capim sobre as nossas cabeças
eu não alcanço suas raízes aéreas
não desfaço com os dedos o branco
pesa-me sobre o peito o incolor
e os meus olhos anzóis
e os olhos dele
poços de sal e mel
por trás das jabuticabeiras
poços de sal e mel
ele ama o seu amor e a ausência dela como ama-se Deus
diz
do you know God?
mas se não creio como sabê-lo?
crês?
sei que a dor não se desfaz
não há Penélope possível
nem novelo ao revés
e se destituíssemos os anteparos
e fôssemos de novo intempérie?
crescem-me, por dentro, as asas
como aquelas que carregam os pássaros da Islândia
plumas azuladas que brotam escápulas adentro
e dizem
é no voo que se refaz a crença
[12 de junho de 2018]
[do Errância, 2018]
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É O NASCER DO DIA
QUE RASGA O PEITO DOS AMANTES
É o nascer do dia que rasga o peito dos amantes,
como o verde que colore os olhos,
na mesma diagonal, o desenho de um milagre.
Plantar na terra
pés com o coração
e não ir mais embora
agora que colocaste o mar no céu.
Enquanto na garganta brota-me
a língua dos antepassados navegadores
meu olhar permanece no horizonte.
(Repátria)
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não há de ser
só escuro o lado
de dentro do muro
o avesso do viço esse pesar
é a retina
que rege o furor das coisas
sob o descompasso da neblina
há terra úmida que germina —
o coração do ventre
mora no olhar
há de se descortinar o céu de si
vento estrela aurora boreal
arrancar da própria costela a mulher que ali habita
morrer-se a cada dia um tanto
concha
semente
pranto
navegar além do canto (e do silêncio)
das sereias do pensamento
Ribeirão Preto, maio 2019.
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Açafrão
Os gatos quando nascem
têm os olhos cerrados à luz
movem-se lentamente no espaço
tacto
pelugem avermelhada
e olfato
deslocam-se tímidos
as patas imensas o corpo macio
cheiram a leite
vivem no sonoro e no escuro
miam silenciosamente para a cegueira do mundo.
É a memória, não o amor, um cão do inferno
unrequited love, I’d say
mas há uma canção de William Carlos Williams que diz mais e melhor:
“Deitado aqui, eu penso em ti: –
A mancha do amor
Domina o mundo!
Amarelo, amarelo, amarelo
o amor devora as folhas,
espalha o açafrão
os ramos feito chifres se dobram
pesam
sobre o suave céu lilás!
Não há luz
só há uma mancha densa feito mel
que cai de uma folha à outra
de um galho ao outro
arrancando do mundo inteiro
as cores —
Tu lá ao longe sob
a orla vermelho-vinho do oeste!”
Outona
e as folhas se dobram sobre o chão
cada coisa se recolhe sobre sua raiz
nas entranhas da terra
os olhos dos gatos
aguardam a primavera
(inédito, 2018)
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Ipês
Nos ramos secos
as últimas três flores amarelas
apontam para o alto,
ainda não é agosto,
mas já definharam,
como meus punhos,
contra a maciça
cancela da vida.
Pedir à lisa superfície
uma resposta.
Esperar que chegue
um clarão
que não cegue.
E se tudo se apagasse agora,
no ruído diurno do aço
de um trem na periferia?
(Repátria, 2015)
[…] o enquilosamento que levaría á morte da literatura. O que acontece é que, despois de ler a Francesca Cricelli xa non estou tan seguro de que o camiño para a anovación estea exclusivamente nas marxes, como […]