O nome de Ryane Leão xa non é un calquera no panorama das letras brasileiras; aínda só levando dous libros publicados, o éxito do seu primeiro Tudo Nela Brilha e Queima tivo tanta repercusión como para facer dela una poeta negra de imprescindíbel seguimento, das que hai que ler para estar ao tanto da poesía brasileira actual.
Mais, vaiamos por partes. Ela nace en 1989, en Cuiabá, e actualmente mora en São Paulo. Os seus país xa a puxeron en contacto coa poesía (comezando con Pessoa, por exemplo, ou Neruda), mais era esa una poesía na cal non se recoñecía. Realmente ela comezou a recoñecerse nas letras escritas cando accede á tradición poética negra , cunha Conceição Evaristo, Bianca Santana, Elizandra Souza, ou Jennyfer Nascimento, Mel Duarte, Elizandra Souza, Angela Davis, Bell Hooks, Audre Lorde… e acha inspiración en poetas como Gabi Nyarai, Ingrid Martins, Deusa Poetisa, Jadequebra, Kimani, Tawane Theodoro, Mel Duarte, Luz Ribeiro, Pam Araújo, Carol Peixoto, Rupi Kaur, Nayyirah Waheed. Un nome é moi importante: Rupi Kaur, pois o seu labor, a súa poesía é frecuentemente emparellado ao da poeta canadiana de orixe indú que é todo un fenómeno de vendas en inglés.
Os comezos poéticos de Ryane son nos lambe-lambe. É decir, xa de inicio se decanta pola poesía como activismo social, pois os lambe-lambe son cartazes que se colocan na rúa e portan unha mensaxe importante para a autora (ou autor). É una forma de graffitti, respectuoso coa arquitectura e co medio ambiente, e, ademais, posúe a característica de ser móbil, de poder deslocalo para outro lugar. Tampouco é un activismo que non se teña que enfrontar ás forzas de seguranza pública, téñase en conta.
Ao seu carón, hai que situar as posibilidades que desde as redes sociais expanden a obra lambe-lambe de Ryane. É do máis interesante visitar o seu Instagram. En realidade aí está a orixe do seu primeiro libro, eran textos seleccionados que ía autoeditar (mediante fianciamento colectivo) até que Planeta, na procura de alguén que nas letras brasileiras puidera asimilarse a Rupi Kaur, deu con Ryane e editou o seu primeiro poemario, que acadou un moi importante éxito de vendas.
Posteriormente publicou Jamais Peço Desculpas Por Me Derramar (2019). Aquí poden vostedes ler parte deste título, ademais xa saben que despois desta introducción virá una pequena “antoloxía” da súa poesía. Agora é momento para indicar que a poesía e a forma que Ryane atopou para se realizar como persoa, para atopar conciencia de si mesma como muller, como muller negra, e como muller negra lesbiana. E é precisamente ese proceso de re-coñecemento, de autocomprensión e de denuncia o que ela aquere trasladar a outras mulleres negras que acolle nun obrdoiro de lectoescritura en inglés (Odara). Nótese que este tipo de actividades é moi frecuente nas autoras negras. Nótese a súa necesidade na sociedade brasileira do século XXI. Será lóxico, logo, que a denuncia do machismo, que a denuncia do racismo estean presentes no fluxo poético da súa obra. Unha escrita de empoderamento e denuncia.
Lean agora a sinopse, obra da propia autora, do seu segundo libro: “mesmo na correria, eu sigo em busca das sutilezas. não posso deixar as distrações passarem batidas.
o peso do mundo não vai tomar conta de minha pele se eu me atentar às brechas, às margens. anteontem
eu vi o mar. recebi abraços apertados que me agradeceram pelos poemas que escrevo com o coração na ponta dos dedos. hoje de manhã as folhas das árvores balançaram com o vento e o barulho foi tão bonito. daqui a pouco começo a cozinhar porque vou receber em casa as pessoas que amo. quero saber de cor o que me traz paz, embora não sejam permanentes as belezas. o caos também não é. e eu estou mudando a cada minuto, então tudo bem. há algo que resiste por entre os escudos, que me relembra que existe uma coisa essencial em ser uma mulher que se reconstrói diariamente: eu sou profunda demais pra acabar.”
Particularmente acho deliciosa a poesía de Ryane, dunha vehemencia expresiva, dunha forza expresiva extraordinarias. Domina moi ben o formato curto do poema, pois ela formouse nos lambe-lambe e iso nótase. É unha autora plenamente consciente do valor da palabra, por iso selecciona moi ben a linguaxe que vai empregar, e nos seus poemas nunca se acha unha floritura, nunca hai fogos de artificio inútiles, todo o que di ten que ser pleno, ten que manifestar a necesidade urxente de auto-expresión ( e autocoñecemento) e de denuncia. Pódese falar, nisto, de poesía sincrética, mais hai que ter en conta que a condicionante de non deixar nada por denunciar está sempre presente aínda sendo textos breves ( e tamén nos menos breves).
Tecnicamente é una poeta moi hábil no formato curto, cun sentido do ritmo expositivo, do estrofado e das estratexias de destaque verbal… que non son experimentos parciais senón una poética plena.
Véxome na obriga tamén de constatar que ela denuncia que no femismo branco non se sente identificada. Triste, moi triste, moito, esta carencia de empatía solidaria do feminismo branco coa muller negra. Porque, finalmente, todas son mulleres, e as máis favorecidas (as brancas) é lóxico que axuden as menos afortunadas. Na niña opinión.
Tamén resulta moi recomendábel seguir o seu Facebook, pois no só dá noticia de eventos, tamén hai moita poesía nos seus post.
E agora vai sendo hora de que chegeu a súa poesía,non sen antes dicir, sendo lesbiana, foi obxecto abusos. Teño que dicilo porque parece que aquí, se dis que toda relación de parella é fonte de conflito, incluido lesbianismo, aquí na Galiza, se o dis estás a te retratar como lesbófobo, pouco menos. Velaquí, logo, esta entrevista onde o denuncia, ou este artigo.
Vai a súa poesía:
de que valerão meus escritos
se outras não falarem
não se contarem
não dançarem
não se manifestarem
não protestarem
não se erguerem
de que valerão meus escritos
se eu me esquecer de direcioná-los
para aquelas que engolem silêncios a seco
que escondidas oram ao impossível
que no ônibus às cinco da manhã
fecham os olhos e sonham rumos
que focam em tapar os vergões
que nunca soltaram do peito os leões
que estão habituadas a vestir
inseguranças
eu que agora tenho a voz audível
não falarei por ninguém
convidarei para virem ao meu lado
para não deixarem se apagar
ou desencorajar
de que valerão os meus escritos
se eu não convocá-las
se eu ignorar da onde vim
se eu parar em mim
*
você precisa ser mais parecida com a água
não tem que ser porto seguro a todo instante
pode ser correnteza e aproveitar pra levar algumas coisas embora
pode ser onda grande no oceano e afogar o que já não importa
se desfazer nas margens
em grandes pedras
ultrapassá-las
pra notar que nada te impede
vez em quando virar uma cachoeira
daquelas enormes e inalcançáveis
ou então lagoa calma mas distante
só nada quem pegar a trilha
você pode ser aquele fluxo de água que desce entre
as frestas de uma rocha
e mostra que algumas rachaduras são necessárias
para que a beleza nasça
quente ou fria
abundante ou serena
jamais peça desculpas
por se derramar
*
tenho muitos nomes
estou em inconstante
transformação
nada me condensa
e pairo onde me inspiro
ultimamente o prazer
tem me convencido
de que ensina bem mais
que o pesar
………………………………..
Você não é uma flor
você é toda uma floresta
bonita
incomum
imensa
inesperada
e deixa seu conselho:
preste atenção em onde pisa
que as minhas raízes
continuam
a crescer
…………………………………….
vem chapar comigo
arrancar meu vestido
apertar minhas coxas
vem revolucionar seu corpo
na minha boca
vem se encharcar
nas minhas correntezas
molhar seus dedos
com meu gosto
e se perder
na minha respiração
descontrolada
te convido a escorregar
suas cicatrizes nas minhas
refazer nossas linhas.
……………………………………
eu sou um monte de
constelações
brilhando e ardendo
mas nem todo mundo
sabe ver
ou só vê a parte que arde
ou só vê a parte que brilha
…………………………………
quantas vezes minha mãe sentou na beira da cama
e me ajudou a retirar os cacos de vidro dos pés
e disse que poucos mereceriam o meu amor
que o mundo me machucaria porque eu tinha nascido
com coração demais
que eu tinha que parar de ser tão boa
ou não me sobraria nada
além dos cacos
que ela arrancava
com cuidado e paciência
plantando flores
no lugar
…………………………………….
quem soube de mim em outros tempos
já não sabe de mim agora
pois quando me quebraram
meus pedaços foram arrumando novos lugares
mais lindos e mais fortes
pra se encaixar nessa mulher que hoje escreve
com punhos firmes e nenhuma culpa
de existir como bem quer
……………………………………..
você me causa
o impacto de um bom poema
abre meu peito
de um lado a outro
e me faz imensa
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ela parecia
aqueles
fogos de artifício
tudo nela brilhava
e queimava
antes de apagar
e virar poeira
………………………………………..
não é para mim esse negócio
de ser imutável
eu quero é transitar
entre meus descaminhos
me transformar
reconhecer meus instintos
tô me desconstruindo
eu sou um universo
se expandindo
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a única vez que perguntei
para minha mãe se ela nunca mais se apaixonou
ela falou que o único homem em que ela confiou
a deixou em pedaços
nesse dia, uma frase me fez entender
certas feridas que meu pai causou
sangram até hoje
e me perguntei quantos iguais a ele
continuam desmoronando mulheres
por anos a fio
……………………………
da importância de encarar a si mesma
escolha seus melhores discos
e tire suas piores dores
pra dançar
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olhe todas as que vieram
antes de nós
não há segredo
a potência de ser mulher
atravessa suas veias
somos fortalezas
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não esqueça
o motivo
de nenhuma de suas
partidas.
…………………………..
31 de dezembro
te liguei um minuto antes da meia-noite
os fogos estavam mais altos que nós
e ficamos ao telefone
sem dizer nada
algumas despedidas
são de uma quietude
estrondosa
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mulher de luta
o beijo dela
tinha gosto
de liberdade
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mulher,
padrões só existem
pra gente quebrar.
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irônico e incômodo
conviver com as sobras de alguém
que só te ofereceu sobras
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não foi dessa vez
ele pretendia confinar
ela pretendia viver.
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quanto a mim
serei poesia
até o fim
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eu quero saber
das opressões que você se livrou
e de como seu cabelo
anda cada dia mais
selvagem e lindo
quero saber da culpa que
não te habita mais
quero ouvir
tudo que te silenciaram
eu quero que você me conte
a história das suas
cicatrizes
………………………………
eu sou um monte de
constelações
brilhando e ardendo
mas nem todo mundo
sabe ver
ou só vê a parte que arde
ou só vê a parte que brilha
…………………………………
que ideia mais estúpida
achar que é melhor sentir dor
a não sentir nada
elevamos o sentir a níveis tão errados
que preferimos atear fogo em nós mesmas
a conviver com nossos vazios.
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Aquí, os POEMAS OBSESSIVOS