Nacida en 1991, Jarid Arraes é una das voces máis novas da poesía brasileira, concretamente da poesía brasileira escrita por mulleres negras. De feito, un artigo seu para Mulheres que escrevem, foi o que me levou a min a concebir esta serie de artigos sobre poetas negras brasileiras, debo recoñecer.
Jarid non só é poeta recoñecida senón tamén cordelista. É dicir, autora de textos de cordel, que é algo novo para nós os galegos e non debería selo tanto. Popularizouse no Brasil aló polo XVIII, e é, en si, unha literatura (poesía) de raigame popular. As fontes consultadas derívana da Lírica Medieval galego-portuguesa, sen deixar de recoñecer tamén a infuencia de “repentistas” ( o que para nós serían os regueifeiros). Dalgunha maneira parécese á poesía popular que aló polo XIX ( e antes tamén, claro) e mesmo no XX…relataba feitos memorábeis para unha comunidade (parroquia, etc), era un tipo de poesía popular que nos levaría a falar dos cantares de cego, por suposto. Esta literatura de cordel é escrita con métrica fixa e, por supoto, rima. Tematicamente é localista, e fíxase sobre todo en aspectos folclóricos. Moitas veces vai ilustrada con xilogravuras. É propia do Nordeste brasileiro ( Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Pará, Río Grande do Norte e Ceará) e moitos autores sentiron a súa influencia, nomes como João Cabral de Melo Neto, Ariano Suassuna ou Guimarães Rosa… Formalmente cómpre salientar a linguaxe coloquial, o uso de recursos humorísticos (ironía, sarcasmo…). mesmo existe unha Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Así chamada, de cordel, porque del penduraban os autores as súas composición para vendelas. Nun xénero tradicionalmente dominado por autorías masculinas, é de sinalar a irrupción de Jarid Arraes como unha excelente noticia para a literatura brasileira feminina, e , aínda máis, negra. E non queremos rematar sen sianlar a súa obra Heroínas Negras Brasileiras em 15 Cordéis polo que ten de reivindicativa das mulleres e sobre todo das mulleres negras, que sempre viviron peores condicións sociais.
Unha vez explicada a literatura de cordel, cómpre sinalar que Jarid tamén é narradora e como narradora acadou notabilidade, para saber máis da autora remitimos a esta ligazón. Agora imos coas súas poesías, que escollemos do seu libro Um buraco com meu nome, co cal se estrea no mundo da poesía convencional. Mais antes de continuar mencionaremos que Jarid contou coa mentoría de Conceição Evaristo, poeta que tamén terá o seu lugar neste noso traballo. Agora si, velaí vai a voz poética de Jarid Arraes, unha das máis interesantes que ofrece o Brasil:
CASA XII
sobre a mesa há uma caixa mística
e nela se encerram segredos
aspirações e ataques traumáticos
seus dedos não
ousariam
abri-la não
com as digitais falhas
oscilantes entre sou isso
e não sou
[nem o céu nem a terra
são indulgentes
com a confusão]
aproxime-se
em silêncio
depois do corpo
lavado
peça permissão
quem sabe sussurro
grito ou canto
quem sabe o encontro
e a queda
da máscara
as coisas pequenas
me importam
porque as grandiosas
estão intactas
as monstruosas imensas
profundas e densas as que
explodem e varrem inteiras
cidades
são coisas que expõem
a pequenez do seu ego
e na minha consciência
racional e gemida
a duras provas e quase
não sobrevivendo
não sinto a urgência
do contato
os cactos por outro lado
os copos as cadeiras e os
cadernos e os pedaços de
carvão as ossadas de frango
assado fazem mais
o meu perfil
advogam por meu caso
mas todas as enormes
palavras as cachoeiras
e tornados todas as mães
e o sangue dos cordeiros
e todas as composições
em nota mais alta e os
pianos e caudas
não são dadas ao toque
e eu não quero tocá-las
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REBENTAÇÃO
há sempre um mar invisível
despejado a conta-gotas
pingando nos olhos de quem sofre
o sal que queima a retina
e as veias
violentas ondas de miséria
só quem sofre
[por amor]
pode saber
as algas presas aos meus cabelos
e o sempre-mar
na ressaca dos meus olhos
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NUNC OBDURAT ET TUNC CURAT
1439 lugares
e eu era a única negra
há espíritos fortes que falam
de racismo
enquanto assistem carmina burana
[eu quebro]
o primeiro ato
é o roubo
quero escrever coisas outras
pássaros vaginas janelas o clima
as lentes o detergente
roubaram de mim
de você desse lápis
desse teclado
a escrita da poesia qualquer
enquanto o cérebro
escurta o circuito
a medicação tropeça
enquanto sou como todas
as outras poetas
fui roubada
quero sofrer como todos
os loucos
e das palavras que surtam
peneirar
a estética
mas se atente
ao movimento
dos furtos clássicos
históricos e afinados
entre todas essas que versam
um papel me foi restado
quantas negras eu questiono
o que escrevem
essas negras
o primeiro ato
é sempre um trato
assinei esse papel
de única e exceção
e agora minhas frases
são fronteiriças
e beatriz eu só queria
escrever sobre as paredes
os olhares e as cadeiras
os baralhos os abismos
1439 lugares
e eu era a única negra
eu deveria estar feliz
porque ocupei esse espaço
montei essa ocupação
solitária
de uma bandeira
parda
[eu quebrei
em mil pedaços]
eu deveria estar feliz
mas beatriz eu só queria
escolher uma poesia
beatriz eu só queria
como todas as poetas
as negras também
surtam
mas o primeiro
ato
é sempre uma
pergunta
onde estão as
negras
onde estão
as negras
[onde estão as negras]
(Este poema está dedicado a Beatriz Nascimento, poeta que tamén aparecerá neste noso traballo)
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TRILOGIA
a primeira vez teve gosto de sukita
as bolhas saindo pelo nariz
afogando a foça de reação
transformando um corpo infantil
em corpo estático
em pedra-pomes
os buracos juntando sujeira
ele despejou em mim
todo o lixo do umbigo aos joelhos
despejou em mim
o riso culpado de quem sabia
porque ele sabia
a segunda vez teve gosto de urina
cheiro de mijo debaixo do sol
molhando a terra e evaporando
marcando o território pátrio
o líquido da madrugada
os copos plásticos de vinho tinto
vinho barato de dois reais
dois litros de mijo na boca
ele despejou em mim
porque ele sabia
mas a terceira vez não teve gosto
minha língua despapilada
observava incrédula
era o suor dos apóstolos o púlpito
e o espetáculo das ordens
e regras
ele despejou em mim
enfeitado de gravata
concreto em sua qualidade
de santo
mas ele soube
que eu também sabia
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PREPARO
escrevo cada letra
como pílulas tarja-preta
que não engoli
uma a uma
como feijões catados na bacia
reproduzindo os dedos ágeis
que minha avó possuía
pego as palavras formadas
prozac
⠀⠀rivotril
⠀⠀⠀⠀azepam
⠀⠀⠀⠀⠀⠀oxetina
e ouço o pingado agudo
que minha avó também
ouvia
pec pec
os feijões bons dos ruins
numa água fria
de torneira
quanto tempo deve-se
cozinhar
um suicídio
antes de comê-lo?
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CINTO DE COURO
a silheta paterna assombra
os sonhos
na penumbra das metáforas
nas figuras de linguagem
na literalidade das surras
das pernas bêbadas
nas mães chorosas
roxas
a figura do pai marca a filha
que marca o filho que marca
a filha e depois a menina
numa cadeia de gritos
ameaças quartos como
masmorras
impedimentos
iniciados na figura do pênis
do cajado que o pai
sacudiu
ordenando
ah minha pequena menina
seus olhos estafados me dizem tanto
a rejeição do pai
o zelo do pai
o controle do pai
o medo o pavor a admiração
a necessidade de aprovação
o esforço contínuo de menina
pobre menina minha
eu me tornei também a continuação
da figura paterna
das oscilações
ora o coração cheio
ora o diminuto corpo rangendo
uma escalada de desconhecimento
seria amor seria ódio
a filha minha pequena garota
que teme todo o desejo ardente
de matá-lo
o pai
eu sei
minha menina
enxergo esse nó
mas não posso desatá-lo
sou também o fruto do pai
da mãe ao chão
da mãe que vestiu calças
foi porta afora
ser figurativa
que pena que não pudemos
escapar
mas tenho boas-novas
não agora mas um dia
o prenúncio os ecos
dos gritos graves
tudo isso virará escolha
em minhas garras
desenharei a linha divisória
nesse chão
daqui
daqui ele não passa
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DESEJO UM MUNDO
desejo um mundo em que
seja fácil
ser só
em que os porteiros
não deem bom-dia
boa-tarde
não me olhem
boa-noite
um mundo em que
a farmácia
seja um de cada vez
sem os toques
dos corredores
sem o deseja a revista
apoiar as crianças
o câncer
moedinhas aqui
já tem cadastro
fidelidade senhora
sem tempo para
sorrir sem
graça
não
obrigada
desejo um mundo vazio
de amenidades
feito de explosões
terremotos
tufos de cabelo
terra nos olhos
um mundo
desmesurado
todo mato
algumas cabras
latas vazias
um mundo sem frutas
sem matérias
reportagens
sobre colesterol
glicose
taquicardia
desejo um mundo
sem filosofia
animalesco
cheio de pelos
as garras afiadas
visão noturna
instinto
de fuga
desejo um mundo
do qual eu possa
fugir
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MEIO DO CÉU
conclamamos os astrólogos
as tarólogas ofertamos nossas
patas à leitura e sobramos na
borra do café porque somos
os únicos bichos preocupados
com o futuro
no entanto
saturno
pode ser apenas pedra
e júpiter pedra
e urano e mercúrio e marte
também a mais pura e
gravitacional rocha
os oceanos sofrem a influência
da lua porém nossos corpos
comportam marés bravias
e o universo não tem assunto
com isso
somos menos que o grão moído
nada nutrimos e causamos
apenas vícios
somos menos que uma concha quebrada
porque o papel da concha
não é adivinhar o porvir
mas se pisada e partida e se nenhuma
metáfora de vida puder ser encontrada
a concha existe e nada espera
porque isso se basta
mas nós aguardamos
balançamos as pernas
queremos compreender
escritos
sobre a casa 2 e vênus
em peixes
queremos o carisma dos melhores
signos e a capacidade de vingança
dos animais peçonhentos
temos a identidade
fragmentada
por mitos
por estrelas que morrem paralelas
buscamos as cartas
as runas búzios moedas as linhas
das palmas os exames caseiros de gravidez
as revistas do joão bidu
queremos o futuro entregue
mas não qualquer presságio
somos ingratos com o acaso
brincamos com a envergadura da nossa força
inutilizada pela ânsia
pelos corações apressados batendo tambores
lendo papéis pelas ruas
esperando pelo amor que seja devolvido
contando os dias a partir da palavra
da mais teatral
feiticeira
do mais serpentino pastor
cortamos nossas raízes e estamos perdidos
acreditamos no contrário
traçamos conjunções e plutônicos
dizemos que somos os mesmos que
todos os outros milhões
de antepassados
mas veja bem
talvez sejamos
talvez não estejamos
tão escandalosamente
errados
estamos mesmo
com o futuro
todos muito
preocupados
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ASAS
feito gato
atiçado
por todo meneio
rápido
eu também sou
atraída
pelos insetos
que se atiram
contra a luz
essa é a utilidade
e o fim
das asas
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Poden vostedes ler máis poesías de Jarid Arraes nesta ligazón (http://jaridarraes.com/tag/jarid-arraes-poesia/page/2/)
Agora imos cun cordel, xénero no que ela é especialista ( conta con cordéis biográficos, outros que son lendas, infantís, sobre cuestións de xénero, sobre cuestións raciais ou LGBT), unha voz de muller, de muller negra, para máis, nun rexistro poético dominado polos homes.
O CORDEL DA AMIZADE
Como duas mãos se tocam
No encaixe do momento
Chega a parecer destino
Um tamanho sentimento
De uma pessoa aqui
Que encontra outra ali
Sentindo pertencimento.
Os olhos da amizade
Descortinam muito além
Que só na sinceridade
Sabe lhe enxergar também
O amigo que te ama
Nunca que ele te engana
Nem te entrega pra ninguém.
Não se faz de esquecida
A memória da amizade
Sobre as linhas tracejadas
Que separam as cidades
Seja numa tela escrita
Ou na lágrima escorrida
Inda vive uma saudade.
Se o céu cair inteiro
Tudo sendo escuridão
E o joelho fraquejar
Temeroso do trovão
Eu te digo o que persiste
E em encorajar insiste:
O amigo em prontidão.
Amizade é coisa linda
Pode vir de toda forma
Não conhece preconceito
Ao chamado não demora
Não se cala na defesa
Mesmo que não saia ilesa
Regenera, se transforma.
É feroz, é bem mansinha
Maternal e protetora
Chama pra beber cerveja
Colorida e instrutora
A beleza da amizade
Está na diversidade
Disso é uma escritora
No entanto, escute bem
O que mais é relevante
Que você jamais esqueça
De quem é mais importante
O maior, melhor amigo
É o que já está contigo:
Do teu peito é habitante
CORDEL DA MENINA QUE NÃO QUERIA SER PRINCESA
Era uma vez uma menina
Dotada de esperteza
Nascida lá no sertão
Batizada de Tereza
Era muito da danada
Arretada de brabeza.
Ela muito curiosa
Gostava de aventura
Carregava bela fama
De fazer muita loucura
Não fazia nove horas
E na queda ela era dura.
Acontece que Tereza
Não era aquela biboca
O povo que exagerava
E gostava de fofoca
Da vida dela cuidava
Feito mimada dondoca.
As carolas da igreja
Só faziam cochichar
Da menina espevitada
Que vivia a badernar
Queriam Tereza quieta
Ajoelhada pra rezar.
Foi que a mãe aperreada
Teve então uma clareza
Mandou trazer um livro
Com história de princesa
Segura do seu sucesso
Deu o livro pra Tereza.
A menina interessada
Logo se botou a ler
Subia e descia o olho
Mas não podia entender
A princesa era frouxa
E nada sabia fazer.
Por causa daquele traje
A princesa não pulava
Passava o dia cantando
E por tudo se acanhava
Não era como Tereza
Que só mais se enjoava.
O livro era bem grosso
Mas nada se assucedia
Tereza se entediava
Virava-se e remexia
Até que parou de ler
Sufocada de agonia.
Mas o pai ficou nervoso
Chamou Tereza de lado
Ameaçou com castigo
Disse estar desapontado
Tanto gritou e berrou
Que acabou muito cansado.
A menina era teimosa
Escapulia na janela
Queria correr na rua
Não brincava de panela
Só queria usar bermuda
Mais no pé uma chinela.
As amigas de Tereza
Todas gostavam de rosa
Era a onda de princesa
De ser loira e ser formosa
Mas essa coisa de Barbie
Ela achava era horrorosa.
Muita frescura enjoada
Muita regra e etiqueta
Tereza era muito ativa
Brincava de carrapeta
Bola de gude, futebol
Patins, terra e luneta.
Só que essa liberdade
Muito em breve ia acabar
Pois trouxeram um cadeado
Para a porta então trancar
Tinha até corrente e chave
Sem chance de se escapar.
Tereza tentou fugir
Mas o pai a segurou
Apertou bem o seu braço
No quarto a trancafiou
Ia da escola pra casa
E bastante ela chorou.
Mas depois de oito meses
Sua mãe foi percebendo
Que a menina estava mal
Amarela e esmorecendo
A culpa bateu bem forte
E ela foi se arrependendo.
Ela viu que tava errada
Essa história de prender
Criança tinha energia
E merecia então crescer
Com bastante liberdade
E com vontade de viver.
Se tem menina princesa
Que gosta muito de rosa
Tem também a danadinha
E que é muito geniosa
Tereza era só um tipo
De garota talentosa.
Conversou com o marido
E impôs sua conclusão
Tinha mudado de ideia
Não aceitaria “não”
Pois estava decidida
Com uma forte opinião.
Foram contar pra Tereza
Que tudo podia fazer
Rolar, pular e dançar
Escalar, cair e correr
E se gostasse de princesa
Isso também podia ser.
A menina deu um pinote
Correu pra pegar a bola
Era feliz dia e noite
Fosse em casa ou na escola
Era alegre o tempo todo
De bermuda ou camisola.
O tempo foi se passando
E Tereza foi crescendo
Cada vez mais entendida
Do que tava acontecendo
Gostava de brincadeira
Mas ia sempre aprendendo.
As amiguinhas adoravam
Esse jeitinho de Tereza
Ela respeitava a todas
E tinha muita esperteza
Na hora que explicava
Que nem tudo era beleza.
Tudo bem gostar de Barbie
De casinha e vestidinho
Mas a vida é muito mais
Que ter tudo bonitinho
Garotas que não precisam
De esperar principezinho.
As carolas da cidade
Que fossem se conformar
Tereza tava bem livre
E pronta pra sapecar
Não tinha gente capaz
De a menina embonecar.
Pois ao papai e à mamãe
Eu peço muita atenção
Que criem meninas livres
De todo tipo de opressão
Que sejam o que quiserem
Cheias de amor no coração.
Pois é muito importante
Ensinar independência
Que sejam bastante fortes
Cheias de resiliência
E com a cabeça feita
Dotadas de competência.
Assim como livre fui
Livre todas devem ser
Aprendendo desde cedo
A sempre desenvolver
Um caráter pertinente
Que saiba se defender.
Meninas são liberdade
São força e revolução
Usam sua inteligência
Com muita imaginação
Sempre com muita coragem
E muita dedicação.
Ser menina não é ruim
E não pode ser castigo
Se ainda lhe restar queixa
Venha se entender comigo
Pois afirmo com certeza
Pra amigo e pra inimigo.
CORDEL “ABORTO”
Quero usar minha poesia
Pra falar de algo forte
De um problema social
Que já causa muita morte
Condenando as mulheres
E roubando-lhes a sorte.
É o aborto clandestino
Feito na ilegalidade
Na sujeira e no terror
Na vulnerabilidade
Respaldado por machismo
E por religiosidade.
O aborto é proibido
Com três casos de exceção
Se causar algum perigo
Não se faz objeção
Se tiver risco de morte
E do feto malformação.
Também é legalizado
Se o estupro acontecer
A mulher pode abortar
Se assim ela escolher
Pois bebê da violência
Não é obrigada a ter.
E o caso mais recente
É o de anencefalia
Que há pouco liberado
Deu-se numa agonia
Mas no fim legalizou-se
Para a nossa alegria.
São apenas nesses casos
Que a mulher pode abortar
Se rolar um acidente
Ninguém poderá ajudar
Se quiser ficar tranquila
Não invente de embuchar.
No entanto, minha gente
Não se consegue impedir
Se a mulher engravidar
Não querendo mais parir
Se ela escolher abortar
Essa lei vai descumprir.
A mulher desesperada
Procurando a solução
No aborto clandestino
Vai buscar sua opção
Mesmo sendo perigoso
Faz-se a interrupção.
Sem ajuda, sem auxílio
Ela faz tudo escondido
Usa chá e usa cabide
E um remédio desmedido
Vai sofrer com sangramento
E ventre comprometido.
Corre então ao hospital
Vendo seu sangue escorrer
Sufocada de vergonha
E com medo de morrer
E ainda tem é sorte
Se puder sobreviver.
Muitas vezes denunciam
Pois não sentem piedade
Acham que ela tem culpa
Fazendo uma crueldade
Sobra muita hipocrisia
Nessa vil sociedade.
Estatísticas não mentem:
Sofre mais a pobre, a preta
Já que o dinheiro oferece
Pro aborto uma faceta
Que é pagar nas escondidas
Noutro lugar do planeta.
Peço então sua atenção
Tente enfim compreender
Que o aborto ilegal
Só condena a morrer
A mulher entristecida
Sem saber o que fazer.
Não se deve legislar
Com base em religião
Pois a fé é relativa
E questão de opinião
Então para argumentar
Deve-se usar a razão.
Quem achar que é pecado
Pode livre assim pensar
É só não fazer o aborto
Seus princípios preservar
Afinal, é sua escolha
E ninguém pode forçar.
Mas o mesmo também vale
Para quem não vê problema
Abortar é uma escolha
É privado esse dilema
Ninguém pode impedir
Nem impor algum sistema.
O governo e o estado
Laicos sempre devem ser
Pois assim se assegura
Liberdade para crer
E pra não ter fé alguma
Cada um que vai saber.
De um jeito parecido
É o corpo da mulher
Que pertence só a ela
Pra fazer o que quiser
Ela escolhe como agir
E ninguém mete a colher.
Vários países do mundo
Decidiram então mudar:
O aborto é permitido
Para quem o desejar
Com apoio e segurança
Pra mulher auxiliar.
Onde o aborto é legal
Há muito mais igualdade
As mulheres já não morrem
Pela clandestinidade
Com amparo e acolhimento
Elas têm mais liberdade.
As mulheres não merecem
Viver nesse sofrimento
É por isso que lutamos
Fazendo esse movimento
Pela vida das mulheres
E seu desenvolvimento.
A maternidade é livre
Pra mulher que a desejar
Se assim for decidido
Se assim ela almejar
Ninguém pode isso impedir
Ninguém pode isso obrigar.
Gravidez não é castigo
E não deve ser imposta
Direitos reprodutivos
É do que a gente gosta
Educar pra prevenção
É parte dessa proposta.
Que os jovens já aprendam
Toda forma de cuidado
Camisinha e comprimido
Dum jeitinho adequado
E pra caso de emergência
O socorro bem prestado.
Ouça bem meus argumentos
E sem falso moralismo
Reconheça que mudando
Há mais chance de otimismo
Se disponha a estudar
Também sobre o Feminismo.
No Brasil a gente luta
Por mudanças importantes
Para todas as mulheres
Não apenas as gestantes
É na união das forças
Que seremos exultantes.
Eu também tenho certeza
Que você já ouviu falar
De alguém que abortou
Por questão de precisar
Não se trata de maldade
Mas sim de necessitar.
Dê um jeito na preguiça
E se ponha a pesquisar
Argumento tem de monte
Para assim te explicar
Que legalizar o aborto
Nada vai prejudicar.
É direito das mulheres
Por direito de viver
Liberdade de escolha
Para se fortalecer
Que a força feminina
Possa então prevalecer.
CHICA GOSTA É DE MULHER
Tem história nesse mundo
Que contar é obrigatório
Porque toca lá no fundo
E resulta em falatório
Como um fato oriundo
De longíquo território.
Bem numa cidadezinha
Pequenina e isolada
Existia uma menina
Muito da desenrolada
Era sapeca e malina
Doida de espivitada.
Chica era o nome dela
Tão bonita de doer
Só que nunca dava trela
Pra moleque aparecer
Sendo muito tagarela
Já partia a responder.
Quanto mais ela crescia
Mais se desinteressava
Com orgulho ela dizia
Que namoro não visava
Nenhum homem que existia
Para Chica ele prestava.
Como amigos tudo bem
Era bom se divertir
Mas se o papo ia além
Chica mandava partir
Não gostava de nhenhém
De chamego ou tititi.
Na cidade se espalhou
Um rumor de confusão
Pois de Chica se falou
Que ela era sapatão
Pois garoto não beijou
Nem quis dar um apertão.
Então Chica se assustou
E ficou sem entender
Refletiu, muito pensou
E findou a se morder
Porque bem se analisou
E por fim chegou a ver.
O que o povo repetia
Era muito verdadeiro
Chica então compreendia
Porque todo o desespero
Pois sua mãe desfalecia
Com tanto do enredeiro.
De rapazes não gostava
Mas achava interessante
Que as mulheres desejava
Dum jeito forte pulsante
E ela tudo imaginava
Com um fogo incessante.
Na real já percebia
Desde que era criança
Que se enchia de alegria
De amor e de esperança
Quando uma amiga sorria
Já lhe tendo confiança.
Foi parando pra pensar
Numa amiga das antigas
Que chamava pra dançar
Sem nunca sentir fadiga
Pois pra ela iria olhar
E sentir frio na barriga.
Mas havia um problema
Bem difícil de enfrentar
Um danado dum dilema
Todo dia a perturbar
Era o bruto do sistema
Que ia a Chica condenar.
Naquela sociedade
Era homem com mulher
Sem nenhuma novidade
Sem melzinho na colher
Escolher felicidade
Nem se muito se quiser.
O povo já se juntava
Prum ataque planejar
De raiva se espumava
A gritar e a xingar
Só faltava balaclava
Pra merda consolidar.
Foram juntos caminhando
Para Chica encurralar
Com o ódio fervilhando
Pra bater e pra matar
Quando a casa foi chegando
Se puseram a atacar.
Era tanta da corrente
Tinha até tocha de fogo
Uma multidão furente
Que não aceitava o novo
Mas a Chica imponente
Saiu pra falar cum povo.
A massa ficou surpresa
Com a tamanha valentia
Assustada com a brabeza
Nem um pio mais se ouvia
Chica cheia de certeza
Falou tudo o que queria.
Ela não se importava
Se gritavam “sapatão!”
Ela muito acreditava
Na grande revolução
Que só o amor causava
Preenchendo o coração.
E ainda disse além
Que já tinha namorada
Já estava com alguém
Louca de apaixonada
E não tinha seu ninguém
Que lhe desse carteirada.
De mulher ela gostava
Todos tinham que aceitar
Se a mãe se incomodava
Que também fosse mudar
Pois amor não se acaba
Só pra gente não falar.
Chamou sua companheira
Que era filha do prefeito
Deu-se uma bandalheira
Confusão de um tal jeito
No meio da barulheira
Escutou-se o sujeito.
Defendendo a sua cria
O prefeito então falou
Que no fundo já sabia
Disso nunca duvidou
E na vil patifaria
Um fim logo decretou.
O povo ficou perdido
Sem saber o que falar
Logo muito aturdido
Para casa foi voltar
Emburrado e remordido
Sem coragem de gritar.
Mas não pense que acabou
Todo o ódio da cidade
Só porque se aquietou
A pior barbaridade
Chica muito que lutou
Para ensinar igualdade.
Mas sua mãe já entendia
Até mesmo se informava
Se encheu de ousadia
E ao povo ela ensinava
Que aquela rebeldia
Muita coisa conquistava.
Pouco a pouco foi mudando
A mente de muita gente
Chica sempre acreditando
Num mundo bem diferente
Sempre amando e batalhando
Se anda sempre pra frente.
Como a Chica existe um monte
De mulher que mulher ama
Como inesgotável fonte
De amor com forte chama
Puro sentimento insonte
Que por igualdade clama.
Conto isso com razão
Para a todos explicar
Que a sincera atração
Não se pode aprisionar
Parem essa amolação
De a tudo controlar.
Que toda Chica da Terra
Se assuma com valentia
Pois ódio só se encerra
Lutando com maestria
Acaba-se logo a guerra
E planta-se a empatia.
……………………………………………………………………….
Este artigo quero dedicalo Á MOZA QUE COMÍA MAZÁS coa que, ás veces, visitaba o paradiso.
As cousas pasan así. Vas unha mañá á secretaría da facultade rsolver un asunto, e por pura casualidade, porque confundes con outra persoa, coñeces unha persoas que será fundamental na túa vida. Empatizamos axiña. A súa alegría vital sacoume daquel pozo sen fondo que supuxo para min a morte de Ana, sobre todo no último ano. Vivimos xuntos momentos extraordinarios, con ela todo era extraordinario. Agardo que sexa moi, moi feliz. Non merece menos.
[…] via JARID ARRAES: poeta brasileira, negra, transgresora, reivindicativa, feminista… — Ferradura en T… […]
[…] e iso é lóxico desde que é aí onde se desenvove máis actividade poética. Con todo, xa con Jarid Arraes excursionamos á poesía nordestina de cordel, que se aparece como unha realidade recoñecida, […]