Alice Sant´Anna, nome imprescindíbel da máis nova poesía brasileira

Porxmeyre

26/04/2020

ALICE SANT´ANNA

Un dos nomes que máis está dando que falar no actual panorama poético brasileiro é, sen dúbida, o de Alice Sant´Anna, nacida no Rio de Janeiro, en 1988. Leva publicados: Dobradura (2008, 7 Letras); Pingue-pongue (2012, independente, impresso en serigrafía con Armando Freitas Fillo; Rabo de baleia (2013, Cosac Naify) e Pé do ouvido (2016, Companhia das Letras) que nós saibamos. E figura nunha edición en castelán (Otra línea de fuego – Quince poetas braileñas ultracontemporáneas, organizado por Heloísa Buarque de HOolanda e traducido por Teresa Arjón) da novas poesía brasileira. Tamén é sigbificativo que se coñeza o seu nome e a súa poesía antes en Madrid que na Galiza. Moi significativo, e por iso esta serie de artigos que estou a publicar nesta Ferradura II, por se en algo amolezo o descoñecemento que aquí, na Galiza, se ten da poesía brasileira ( máxime da poesía de mulleres), aínda sendo a ddo Brasil e a da Galiza linguas que nacen do mesmo rego de auga, se é que non continuan a ser augas do mesmo mar.

Poucos son os datos biográficos que dela puiden pesquisar, pois é aínda moi  nova. Sei que comezou a escribir con 16 anos, aproveitando unha viaxe a Nova Zelandia e despois de coñecer a Ana Cristina Cesar, é poesía de mocidade mais xa entón chamou a  atención. Que estudou e se graduou en Xornalismo e posteriormente en Letras na Pontificia Universidade Católica do Río de Janeiro. E que, sendo tan nova, mesmo é colaboradora do jornal O Globo  e na revista Serrote publicada polo Instituto Moreira Salles

No seu labor poético non só é importante o nome de Ana Cristina César, poeta ela que se suicidou aos 31 anos, senón tamén o de Armando Freitas Fillo, que mantiña boa amizade con Ana Cristina ( ás veces asina Ana C. ) e tamén a mantén con Alice.

Tamén sei dela que non é poeta que planifique os seus poemas, pois os seu spoemas nacen no momento máis inagardado. Son poemas que convidan á reflexión, certamente, mais na súa orixe maniféstanse coma unha incontíbel forza de se expresar por parte da autora.

Son imortantes as vixes na súa vida e produción poética (Nova Zelandia, Francia), mais non escribe poesía de viaxes senón que a viaxe lle proporciona un punto de desconexióncoa realidade habitual, e é esa desconexión que fai nacer nela a poesía, interpretamos nós. A propia Alice fala da estrañeza non só como orixe da súa poesía senón da poesía en xeral.

Deixo aquí ligazón co seu blog, aí poderedes ler poemas que eu non recollo ( outros si), ademais de prosas moi breves.

E queremos comezar a presentarvos a súa poesía precisamente a partir dunha figura ( a balea) que tivo bastante predicamento entre as escritoras galegas hai uns anos.

um enorme rabo de baleia

cruzaria a sala nesse momento
sem barulho algum o bicho
afundaria nas tábuas corridas
e sumiria sem que percebêssemos
no sofá a falta de assunto
o que eu queria mas não te conto
era abraçar a baleia mergulhar com ela
sinto um tédio pavoroso desses dias
de água parada acumulando mosquito
apesar da agitação dos dias
da exaustão dos dias
o corpo que chega exausto em casa
com a mão esticada em busca
de um copo d’água
a urgência de seguir para uma terça
ou quarta boia e a vontade
é de abraçar um enorme
rabo de baleia seguir com el

Sedundo a crítica,  o segundo libro (Rabo de baleia), publicado con 24 anos,presenta unha meirande maturidade na poesía de Alice, como recoñece a antóloga Heloísa Buarque. Porén, a propia Alice nega este feito.

Mái poemas de Rabo de Baleia

TITINA

1.
caminhávamos na estrada de terra
o dono da casa apoiado
numa bengala de madeira
parou e apontou para o lago
onde uma árvore seca continua seca
desde que compraram a fazenda
lá se vão trinta anos a árvore
seca no meio do lago

2.
aqui dá muita formiga saúva, s. disse
a verdadeira praga do brasil (quem disse?)
a formiga rainha é maior que as outras
e todas dependem dela de suas ordens
quando ela morre todas as outras morrem
por isso a melhor solução pra acabar com a praga
é matar a rainha
ela já nasce rainha?
como as outras são capazes de reconhecê-la?
s. não soube responder ou se distraiu
esmagando um inseto
com a ponta da bengala

3.
quando m. foi cumprimentar
a dona da casa ela falou surpresa
que ele era a cara do harry potter
vou chamar um mágico, ela gritou
e tomou a agenda o telefone
convidou-o para o dia seguinte
ainda que já fosse tarde da noite
todos sentados na sala de jogos às oito
em ponto à espera do mágico que vinha
de petrópolis

4.
era duro ver aqueles truques tão de perto
d. tentava a qualquer custo desmascará-lo
olhava cheia de olhos, deve haver algo
entre as mangas
jura que a bolinha vermelha
estava escondida no bolso do paletó
mas ninguém acreditava, a bola
surgiu do nada mesmo, o truque da carta
aparecer dentro do limão, como pode?
depois voltamos para a sala de jantar
vovó não estava com força
nas pernas, eu e g. a conduzimos
pelo caminho de pedras cada uma
segurava um braço

5.
o nome do cavalo era mistério
não contei nem a g. nem a l. a aranha
pendurada no teto
em um fio invisível a aranha
sobre nossas cabeças
poderia pôr tudo a perder
se bem que eles já eram craques
corriam na trilha de barro e aos poucos
éramos deixados pra trás: eu e mistério
galopávamos a toda para alcançá-los
o sol era forte e me deixou
a marca da camisa

*

a sandália nova branca com dedos
que se refestelam do lado de fora
como crianças que sabem o verão que vem
de repente a chuva míngua os planos
da calça jeans com sandália de dedo
uma combinação entre-estações
para não se sentir nem tão lá nem tão
cá os dedos curvados corcundas feito crianças tristes
as unhas recém-cortadas que planejaram
se mostrar sobre a cadeira de rodinhas
mas que nada a água inundou a sexta
da janela os bambus se movem muito
chegam a parecer desesperados
as folhas penduradas são cabelos colados
que gritam novas rugas onde nada havia

*

se ficar bem quieta
conto o que nos trouxe aqui
eu e ela
todas as palavras
roubadas da estante de cerâmica
da mais cara são objetos
que se lançam
com o risco de espatifar no chão
passei muito tempo tentando dizer
mas quando abria a boca o que pintava
era uma bailarina de caixa de música
que girava no ar contra a minha vontade
ela não sabe mas eu queria mesmo
era ser franca dizer que o sol batendo
na mesa é meu
os caquis na fruteira
os papéis que o menino do correio
lança por debaixo da porta
todas as coisas que posso
segurar isso é meu

*

abro o envelope
e espero praias grandes paisagens
sua letra miúda contando coqueiros
a data à caneta
marcando meses anos
que não nos vemos. mas o envelope
branco e frágil
traz estrela cadente na borda
anéis de saturno onde você talvez esteja
um homem-palito astronauta
boiando num céu estrelado. você talvez
tenha desenhado numa noite de lua
nunca vou saber
onde foi que gravou
esse sofá amarelo, essa porta de geladeira
numa cozinha de pedra são tomé
uma cadeira sobre fundo
de azulejos verdes. me pergunto
se diante de tantas paisagens
por que você só mostra
os cantos das casas por onde passou
nenhuma janela aberta
nenhuma amostra
se faz sol ou chuva
se aí também amanhece

§

a bola branca entrou manchando
toda a sala de branco
de luz do inverno
que não esquenta, mas se não
sentíssemos nada não usaríamos casacos
pois a luz já convenceria do calor

aqui nessa casa a luz entra
por trás de bambus
bambus amarelos, alguns pendem
e as folhas pairam no ar às vezes
mexem para provar que não são fotografia

tem dias que a arrumadeira
por descuido deixa a porta do banheiro aberta
quando vai tratar de outra coisa
em outro canto a porta aberta
permite que eu entre no banheiro antigo
onde os visitantes não têm acesso
já que a porta fica sempre fechada

por um minuto posso ver secretamente
a banheira com a torneira dourada em forma de ave
e o espelho com ferrugem no entorno
tudo isso me dá um imenso prazer
a casa à noite, ninguém a habita
caminho sozinha
entre paredes de vidro

POEMA INÉDITO


a sombra do avião atravessando
a copa das árvores não carrega ninguém
que se despeça ou tome chá
água fervida em bule de ágata
na sombra do avião não há quem acorde
com os pés pendurados pra fora do colchão
não há ninguém que uma vez tenha se assustado
com o sangue do nariz
colorindo de vermelho a cama
em plena madrugada a sombra do avião
não faz sentir saudade nem pena
nem vontade de ir com ele e cruzar
a copa ou o quarto
pode apenas olhar pra baixo
quem vê a sombra do avião
na copa entre as

Do seu primeiro poemario: Dobradura (2008)

quando faltou luz
ficou aquele breu e eu
com as mãos tremendo
morta de medo
de tudo se iluminar
de repente

***


na esquina da rua
um piano que toca
notas esparsas
em lá menor

nunca vi
o rosto de quem
se esconde por trás
de acordes sustenidos

e que desfila dedos no teclado
com a leveza de quem
sustenta passarinhos
no ar

***

RUA DOS BACALHOEIROS

na rua dos bacalhoeiros
em frente à casa dos bicos
pontualmente às seis em pleno domingo
todas as lojas fechadas
sento na calçada para assistir
ao balé das andorinhas
são milhares, trilhares em revoada
que mergulham sincronizadas
feito um cardume
para anunciar em coro
os últimos dias de inverno

***

SETE ANOS

ela come tangerina
com centenas de dedos
meditativos
empenhados na função
de descascar, separar um gomo
do outro
mas não mastiga, empurra
com a língua até a pele
descosturar
feito tecido ou papel
e romper
em suco

depois caminha pelos quartos
acaricia os cabelos das bonecas
muda a posição dos objetos
desliza dedos pelas paredes

até que cada canto da casa
cheire como os dias de verão

***

dentro do apartamento
a janela sustenta a paisagem.
me aproximo, apóio
os braços: todo o mundo
desmedido
em minha frente.

mas nada
que eu possa segurar, reter.
nem mesmo o perfume
dessas tardes sem perfume, nem
um bibelô
para colecionar na estante
como fazem as avós
que não medem cuidados
com a porcelana

E outro “inédito” publicado en O Globo

COPACABANA

 quando chegou em casa

o gato não estava na porta

como de costume o gato pensa

que é um cachorro

traz um elástico de cabelo

na boca para ser arremessado

e depois busca e devolve o elástico

de boca aberta, arfando

a noite é um cupido perigoso

é o que você pensa enquanto esconde

as unhas que esqueceu de cortar

olha para a piscina do hotel

onde vocês fingem que estão hospedados

no duzentos e um

só pela graça de tomar um táxi

rumo a um hotel na própria cidade

como naquele livro que fala

sobre ir a um restaurante com a namorada

e memorizar todos os gestos

para depois de meia hora voltar

e sentar na mesma mesa e pedir

o mesmo prato e reclamar igualzinho

que o ar condicionado

está muito gelado

por fim pagar a conta com a mesma nota

para deixar maluco o garçom

que não entende se aquilo é um déjà vu

se não está precisando descansar

se tem trabalhado demais

pergunta porque nesse hotel

as pessoas não se vestem

como nos anos cinquenta

se seria feliz morando aqui

com pouca coisa para carregar

além da roupa do corpo

ela insiste que não consegue

ver as mãos nos sonhos

antes de dormir você olha fixo para os dedos

para esse quarto que ainda precisa

de alguma parafernália para não ser

um duzentos e um qualquer

as coisas não podem

ser nem leves demais

nem pesadas demais

as coisas têm que ter um peso

muito específico

de manhã o gato olha pela porta

Aquí podedes escoitala recitando poemas de Rabo de baleia

Porxmeyre

Deixa unha resposta

O teu enderezo electrónico non se publicará Os campos obrigatorios están marcados con *

Skip to content