Non podíamos rematar esta serie de artigos divulgativo da poesía de muller brasielira (este é o penúltimo, queda outro para completar o ano) sen tratar a poesía indíxena, moito menos coñecida que a de muuler branca, moito menos coñecida que a de muller negra, porén tan imprescindíbel coma calquera delas á hora de falar das poesías do Brasil. Imprescindíbel, fundamental, e moi recente. Como é fácil imaxinar, a expresión oral dos textos (con todo o que iso significa, ton, ritmo, música, danza…) é moi importante, desde o punto de vista occidental chamariámoslle performativa. Porén esa é unha visón occidental e, o que é a creación literaria indíxena, nin sequera ten porque corresponderse co canon literario occidental. Por outra parte, se a literatura de muller negra reivindica a africanidade fronte ao eurocentrismo (ou ocidentalcentrismo) branco, foi e é perseguida, marxinalizada… as expresións literarias que reivindican o valor do autóctono, o valor do pre-colonizado aínda o foi máis. Concretamente, Eliane Potiguara, que foi quen comezou a tradición literaria da poesía indíxena denuncia que foi perseguida e ameazada de norte, neste esclarecedor encontró que non deben perder
Eliane Potiguara mesmo pode e debe ser considerada a iniciadora desta tradición literaria indíxena, tradición que agora, no século XXI, loita por consolidarse. Mais daquela, nos 70 e 80 do pasado século era toda unha novidade. E, se a poesía negra atopa dificultades de edición, a literatura indíxena aínda moito máis. Se a literatura negra botou man, por sinal, dos lambe-lambe, iso non é moi distinto dos póster que Eliane comezou facendo para dar a coñecer a súa obra. Se a poesía negra acode con frecuencia á oralidade, porque a xente negra ten menor poder adquisitivo e menor posibilidade de publicación…xa poden imaxinar que a problemática indíxena aí é moito máis grande. Para máis, a literatura indíxena exprésase con moita frecuencia no relato de contos ou mitos relativos ás diferentes etnias indíxenas, como unha maneira de preservar o seu legado cultural. Isto puido influír en que as editoras cualificaran esta literatura como literatura LIX (literatra Infanto-Xuvenil), que non deixa de ser unha forma de censura…unha forma de censura (os textos eran para adultos) que non foi todo o eficiente que quería ser, porque a LIX é a que máis cartos proporciona ás autorías. Por outra parte, aínda cabe falar de textos que se publicaron primeiro fóra do Brasil e despois foron/son traducidos para o portugués brasileiro, como claro indicativo da dificultade para publicar, da censura editorial, que a literatura indíxena padece.
Aínda tratándose da Wikipedia, aquí poden vostedes ler unha panborámica da actividade política e social de Eliane Potiguara que eu vou renuciar a escribir, toda vez que o meu interese é divulgar a súa poesía. Por certo, nesa ligazón está ausente a súa última obra, Metade cara, metade máscara, de 2020, vencedora do Premio Pen Club en Inglaterra!, e do Fondo de Libre Expresión USA!
A resistencia fronte ao colonialismo europeo, que aínda non cesou, e moito menos no Brasil, conleva o tratamento de temáticas que constrúen ou divulgan outra maneira de ver o mundo, cousa que ese colonialismo non lles perdoa, na súa tentativa de erixirse como única interpretación posíbel da realidade e do mundo.
Como sempre, déixolles ligazón
para a súa páxina web
e, por suposto, o seu
E agora vai a súa poesía, na que non faltará a Oração pela libertação dos povos indígenas, e que, como comprobarán, resulta dunha calidade ben grande…aínda a ollos dun europeo deste lado do Atlántico.
E con Eliane gritemos LIBERDADE!
(Na Revista Cazemek)
AGONIA DOS PATAXÓS
Às vezes
Me olho no espelho
E me vejo tão distante
Tão fora de contexto !
Parece que não sou daqui
Parece que não sou desse tempo.
PANKARARU
Sabem, meus filhos…
Nós somos marginais das famílias
Somos marginais das cidades
Marginais das palhoças…
E da história ?
Não somos daqui
Nem de acolá…
Estamos sempre ENTRE
Entre este ou aquele
Entre isto ou aquilo !
Até onde aguentaremos, meus filhos ?…
…………………………………
ESSÊNCIA INDÍGENA
Um dia
Esse corpo vai apodrecer
E eu vou ser verdade…
Então eu vou ser feliz.
…………………………………….
NESTE SÉCULO DE DOR
Neste século já não teremos mais os sexos.
Porque ser mãe neste século de morte
É estar em febre pra subexistir
É ser fêmea na dor
Espoliada na condição de mulher
Eu repito
Que neste século não teremos mais os sexos
Tão pouco me importa que entendam
Possam só compreender em outro século besta
Não temos mais vagina, não mais procriamos
Nossos maridos morreram
E pra parir indígenas doentes
Pra que matem nossos filhos
E os joguem nas valas
Nas estradas obscuras da vida
Neste mundo sem gente
Basta um só mandante
Neste século não teremos mais peitos
Despeitos, olhos, bocas ou orelhas
Tanto faz sexos ou orelhas
Princípios, morais, preconceitos ou defeitos
Eu não quero mais a agonia dos séculos…
Neste século não teremos mais jeito
Trejeitos, beleza, amor ou dinheiro
Neste século, oh Deus (? !)
Não teremos mais jeito.
………………………………….
UNI-ÃO
*UNI (União das Nações Indígenas)
O que tenho pra te oferecer amigo
Enquanto bebo tua fonte que me espera.
São palavras, são sentidos, são perigos
Ou são silêncios profundos de uma era
O que tenho pra te oferecer amigo
Enquanto sugo de teus olhos uma velha história.
São prazeres, são amores, roucos gritos
Ou sussurros de vencer até a vitória
O que tenho pra te oferecer amigo ?
Enquanto me aqueço no calor de tuas mãos
São lágrimas, são motivos, são juízos
Ou são faíscas conscientes da razão
Andaram a procurar por mim
E eu estava só, triste e doente
E você amigo me estendeu a mão
Mesmo com palavras duras que não mentem
Amigo, tu moras no fundo de minh’alma
E o que tenho pra te oferecer ?
Só muita garra
Muita luta
Uma grande gratidão.
Pra nunca desvanecer…
Pra nunca desmerecer…
Pois te amo com grande afeição !
………………………..
DESILUSÃO
A mim me choca muito esse ambiente
Essa música, essa dança
Parece que todos dizem sim.
Sim a quê ?
Sim a quem ?
Porque concordar tanto
Se o que se tem que dizer agora
É NÃO !
NÃO a morte da família
NÃO a perda da terra
NÃO ao fim da identidade.
Eliane Potiguara
***
FANTASIAS DESERTAS
Não tenhas medo, IANUÍ
Que não vou-te enfeitiçar
O nada, eu quero de ti
Pro nada talvez vou partir.
Poema de Amor ?
Sei lá… se poema de amor !…
Só sei que me passa essa chama
E que me queima a alma errante.
Horas, mas dias, mil noites
Relembro teu corpo parado
Feito máscara imóvel ao vento
Doido a flutuar nos mares quentes.
Pássaro louco bicando os peixes
Engorda teu peito aberto
Inflama teu coração militante
É tua, essa paixão dos séculos
Mas te guardas feito tatu
Que não é chegada a hora
Enfia teus dedos na terra
Desafoga as dores nela !
Mira pros céus navegantes
De teu barco em flor e vela
E rouba todas as forças solares
E renasce Boto, amante, mais belo.
Engorda teu peito aberto
Aquece o coração nu noutras eras
Alimenta tuas veias em asas
Nas fantasias desertas
Corre pelos cajueiros e arrozais
Que te trago essa cana caiana
E outras limas pra melar nossas bocas
E relaxar no calor das manhãs
Eu não te quero mais puro
Entrega-te que te vejo criança
Amor pronto a explodir
Fogo eterno, quem sabe ?…
Ou vou partir, antes mesmo de vir
Num calor aberto semente…
Numa ilusão e sonho somente…
Nessa estrada longa, errante
Sendo meu caminho tão farto
Sendo teu peito tão forte
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(Na Pressenza)
Oração pela libertação dos povos indígenas
Parem de podar as minhas folhas e tirar a minha enxada
Basta de afogar as minhas crenças e tirar minha raiz.
Cessem de arrancar os meus pulmões e sufocar minha razão
Chega de matar minhas cantigas e calar a minha voz.
Não se seca a raiz de quem tem sementes
Espalhadas pela terra pra brotar.
Não se apaga dos avós – rica memória
Veia ancestral: rituais pra se lembrar
Não se aparam largas asas
Que o céu é liberdade
E a fé é encontrá-la.
Rogai por nós, meu Pai-Xamã
Pra que o espírito ruim da mata
Não provoque a fraqueza, a miséria e a morte
Rogai por nós – terra nossa mãe
Pra que essas roupas rotas
E esses homens maus
Se acabem ao toque dos maracás.
Afastai-nos das desgraças, da cachaça e da discórdia,
Ajudai a unidade entre nações.
Alumiai homens, mulheres e crianças,
Apagai entre os fortes a inveja e a ingratidão.
Dai-nos luz, fé, a vida nas pajelanças,
Evitai, ó Tupã, a violência e a matança.
Num lugar sagrado junto ao igarapé.
Nas noites de lua cheia, ó MARÇAL, chamai
Os espíritos das rochas pra dançarmos o Toré.
Trazei-nos nas festas da mandioca e pajés
Uma resistência de vida
Após bebermos nossa chicha com fé.
Rogai por nós, ave-dos-céus
Pra que venham onças, caititus, seriemas e capivaras
Cingir rios Juruena, São Francisco ou Paraná.
Cingir até os mares do Atlântico
Porque pacíficos somos, no entanto.
Mostrai nosso caminho feito boto
Alumiai pro futuro nossa estrela.
Ajudai a tocar as flautas mágicas
Pra vos cantar uma cantiga de oferenda
Ou dançar num ritual lamaká.
Rogai por nós, Ave Xamã
No Nordeste, no Sul toda manhã.
No Amazonas, agreste ou no coração da cunhã.
Rogai por nós, araras, pintados ou tatus,
Vinde em nosso encontro
Meus Deus, NHENDIRU!
Fazei feliz nossa mintã
Que de barrigas índias vão renascer.
Dai-nos cada dia de esperança
Porque só pedimos terra e paz
Pra nossas pobres – essas ricas crianças.
……………………………..
(En Paixão Melancólica)
BRASIL
que faço com a minha cara de índia?
e meus cabelos
e minhas rugas
e minha história
e meus segredos?
que faço com a minha cara de índia?
e meus espíritos
e minha força
e meu tupã
e meus círculos?
que faço com a minha cara de índia?
e meu toré
e meu sagrado
e meus “cabôcos”
e minha terra
que faço com a minha cara de índia ?
e meu sangue
e minha consciência
e minha luta
e nossos filhos?
brasil, o que faço com a minha cara de índia?
não sou violência
ou estupro
eu sou história
eu sou cunhã
barriga brasileira
ventre sagrado
povo brasileiro
ventre que gerou
o povo brasileiro
hoje está só …
a barriga da mãe fecunda
e os cânticos que outrora cantavam
hoje são gritos de guerra
contra o massacre imundo